segunda-feira, 27 de junho de 2016

Isla Negra

naveguei nas águas frias e profundas do Pacífico
chorei na casa de Neruda
enchi meus pés de areia
e nem o barulho das conchas batendo contras as pedras
diminuíram minha dor naquele momento

estava sangrando
a ferida estava completamente aberta

respirei, muitas vezes, profundamente
naquele dia frio, com sol a pino, de uma manhã chilena

queria desaparecer
a cada passo, queria apenas desaparecer

tentava entender as loucuras do poeta e as minhas
quantas coleções
quantas confusões
quantos amores

Neruda amou enlouquecidamente
e foi ali que escreveu "Confesso que vivi"

não entendi na ocasião todo aquele emaranhado de bugigangas
sim, eram bugigangas
afinal, para que servem aquelas coisas, se não para acumular poeira e saudades?

fui sangrando pelo caminho
continuei sangrando com o passar dos dias
longos e terríveis dias

até que
o vento fez a porta de vidro se arrebentar:
estava viva
estou viva
quero estar viva

olhei pra trás e o poeta estava complacente
ao lado da mão da amada, olhando o mar

estava pleno

estava plena

entendi, então, que é preciso sangrar
ferir
acumular poeira nos cantos
ter saudades
para, então,
jogar fora as bugigangas

fechei a porta, já arrebentada,
e segui.

não precisei olhar para trás
estava tudo na minha frente:
poesia, mar, céu, areia, vida.




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