terça-feira, 29 de março de 2011

me desconheço

eu já tentei me matar quando era criança. não sabia como, mas tentei.
você já parou para pensar nisso? ali, fazendo o que pensava ser chegar ao fim, aos 10 anos de idade, apaguei as luzes do quarto, deitei embaixo da cama e esperei a morte chegar com o que tinha tomado. obviamente, ela não chegou. e antes mesmo que ela tentasse me matar, a morte foi interrompida com um grito de "vem comer".
de lá pra cá, o mundo foi só um tropeço após o outro, sempre com uma vontade interminável de deitar embaixo da cama, no escuro, esperando a morte chegar.
não fui preparada pra ela, ninguém foi. e ainda que digam (e eu vivenciei isso) que no México, por exemplo, a morte é uma festa, porque a vida é uma passagem, duvido que não doa pelo menos um pingo.
conheci gente que não se importou.
conheci gente que se importou até demais.
conheci gente que quis ir junto, esquecendo que ainda estava viva.
mas não me conheço.
quando vejo o filme As Horas, meu preferido por cada detalhe daquelas três personagens que são simplesmente tão reais e se parecem sempre comigo sempre em algum ponto, eu choro. Laura Brown é isso: alguém que viveu uma vida de mentira, tentou se matar e foi a única que sobreviveu. enterrou marido, que tinha ido pra guerra, e enterrou o filho suicida e desesperado por entender uma mulher tão fechada em si como a mãe.
não, longe de mim ser Laura. não vivo de mentiras, minha vida é real e como diz o Saramago, a mim me deram um coração de verdade, que sangra. é que quando é tudo tão bom, quase perfeito, feliz e sem falsas emoções parece não ser real. sempre algo dizendo "ei, essa não sou eu". mas quem sou?
me desconheço.

quarta-feira, 23 de março de 2011

sabe quando se olha pra trás e tem exatamente a certeza que em um período da sua vida você foi extremamente feliz? pois é, eu fui. fui muito mesmo.

sexta-feira, 18 de março de 2011

eu já tomei dores demais que não eram minhas e me sinto acuada em mim hoje em dia. me sufoco entre os lençóis, me mato em cada minuto atordoado do meu tempo. sempre é um tiro, sempre é no peito, sempre em mim, sempre fatal. eu sinto a entrada dele todos os dias. e por mais que o sinta entrar, não consigo imaginar a dor que é cortar tecidos, ultrapassar peles, sufocar o coração. não lembro qual foi a última vez, todas parecem últimas e me atordoo com o fato de não focar meus pensamentos. tenho me atordoado a cada virada de esquina, me questionado pra onde o amor vai quando ele termina e fico pensando se de fato houve amor algum dia de alguém que disse que o que sentia era amor. não, não era. não sei mais. não consigo parar, sentar e imaginar um mundo rosa. não consigo acreditar que vou repassar isso pra alguém algum dia. não as aflições, mas a vida. dizer "viu, isso é o mundo". me afogo cada dia mais no meu poço. meus buracos de tristeza, de infelicidade, de perda de tempo vão ficando cada vez mais amplos, juntos, formam um vão.

entre mim e o que fui, não resta nada.

sexta-feira, 4 de março de 2011

quem sabe?

Quem me conhece de verdade?

Quem sabe que minha cara amarga, na verdade, é só tristeza com o mundo?

Quem sabe que eu me arrepio e me revolto de verdade com situações como a dessa menina Lavínia?

Quem lê que minhas olheiras são das noites que eu perdi pensando em como pensar, em como agir, em como ser?

Quem sabe que meu andar torto é exatamente igual ao do meu pai?

Quem sabe que até hoje eu falo papai ao invés de pai e morro de vergonha por isso, algumas vezes?

Quem vai me ler e não se preocupar com os capítulos horríveis?

Quem vai entender que, às vezes, as coisas simplesmente não são para ser entendidas?

Quem vai me abraçar ao invés de falar que eu preciso me cuidar?

Quem vai entender que meu descuido comigo é intencional? Uma forma de escapar logo de um lugar que eu não fui feita pra morar?

Quem vai querer me tomar pra si e falar “vem comigo”?

Quem vai saber do que eu rio?

Quem vai saber por que eu choro?

Quem vai saber que sou extremamente feliz pelos picolés de uva e limão da Kibon existirem?

Quem vai saber que eu trocaria dezenas de sapatos de salto por um all star 36 branco?

Quem de verdade sabe que all star é pra sujar?

Quem sabe que eu mataria, mas mataria mesmo, quem fizesse mal aos meus pais, minha tia, meu irmão e meu sobrinho?

Quem sabe que eu defendo meus amigos até o fim, mesmo que algumas vezes eles estejam errados?

Quem sabe que minha palavra de ordem é saudade?

Quem sabe que a forma bruta e pouco amável de agir me tira pessoas da mesma forma que coloca?

Quem sabe que eu errei muito, erro e vou continuar errando?

Quem sabe que eu sei que solidão não me irrita e que pra mim é quase estado de espírito?

Quem sabe que eu sou confusa demais, muito mais que o normal?

Quem sabe que eu conto as piadas mais sem graça do universo?

Quem sabe que no fundo quem sente sou eu, não você?

Quem sabe o quanto me entristece estar fora de planos que eu queria estar dentro?

Quem sabe que adoro o cheiro de baunilha?

Quem sabe que eu realmente amo viajar?

Quem sabe que eu detesto comer coisas amargas?

Quem sabe que cheiro de tequila tem sabor de México?

Quem sabe que continua sendo muito doloroso crescer?

Quem sabe que minha melancolia não me deixa evoluir?

Quem sabe que datas comemorativas sempre me irritam, principalmente Carnaval, Natal e Ano Novo?

Quem sabe que eu tenho medo da morte, não da minha, mas das pessoas que eu amo?

Quem sabe que eu gostaria muito de me esbarrar com o Manoel de Barros, o Chico, a Frida, o Bukowski, o Drummond, o Niemeyer, o Vinicius, o Tom, o Beethoven, a Woolf, o Almodovar, o Bresson, e tantos outros e falar “obrigada por existirem em mim”?

Quem sabe que poucas vezes eu enxergo a minha vida feliz?

Quem sabe que eu quase venderia minha alma para não ter mais enxaqueca?

Quem sabe que eu me vejo só e quem sabe que eu absorvo muito, mas transformo isso em pouco?

Quem sabe?

Eu não sei.

Sinceramente, não sei.